sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

Será a escola uma utopia?

O Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (CEBRAP), com o apoio da Fundação Victor Civita, de maio a dezembro de 2012 realizou uma pesquisa para compreender como os adolescentes (1) de famílias de baixa renda encaravam a escola. O resultado está no relatório “O que pensam os jovens de baixa renda sobre a escola” e revelou que eles não veem sentido em muitos dos conteúdos ensinados em sala e reclamam que os professores não usam a tecnologia durante o ensino.

Concluiu-se que as escolas de ensino médio não estão preparadas para lidar com essa juventude em permanente processo de transformação, com estilos próprios, que sente a necessidade de manifestar sua identidade, que busca reconhecimento e autonomia e que dá grande importância à dimensão lúdica: divertir-se, brincar, zoar.

Este ponto fez-me lembrar do aprender brincando, de estudar sim, mas se divertir também, por que não? Existe a possibilidade de a escola não ser tão “chata”. Inúmeras pesquisas e ferramentas a respeito do uso de jogos como recursos para a aprendizagem já existem à disposição dos professores. A WebQuest pode ser usada para engajar os alunos nas tarefas e até mesmo uma simples produção de vídeo com auxílio de um celular com câmera são formas de “brincar” com os assuntos que estão sendo apreendidos.

Contudo, os jovens entrevistados reclamaram da falta de uso de tecnologia pelos professores. Daí vem uma afirmação que tento desmistificar sempre: muitos professores ainda acham que aluno de baixa renda, proveniente de uma comunidade mais carente, estudante de escola pública sem laboratório de informática não conhece computador, nem Internet, nem celular com Internet.

Agora não sou mais eu a dizer isso, mas na pesquisa, essa sobre a qual estamos falando, “todos” (sim, todos) os jovens participantes utilizam a Internet e têm perfil no Facebook – Sim, esses jovens que conhecem a tecnologia são de baixa renda -, porém, menos de 50% deles usam Internet na escola. Em alguns casos, os professores nem conhecem ou não sabem como funcionam essas novas tecnologias.

O que se pode concluir a partir dos resultados é que a escola acaba por distanciar os adolescentes por não ser um ambiente para partilha, para interação, para a criação, principalmente. As disciplinas curriculares, no formato atual, dão ao estudante a sensação de que os conteúdos são inúteis; eles sentem que não precisam aprender [decorar] tudo aquilo.

O fato, que todos sabem e é redundante repetir, mas vou repetir, é que o conhecimento não se constrói somente quando o jovem entra na sala de aula, senta quieto na carteira e ouve o que o professor vai dizer. Até chegar nesse ponto ele já pode ter ouvido de diversas formas a mesma coisa porque hoje ele tem acesso à tecnologia e à informação de uma maneira mais rápida e fácil do que era antigamente, mas ele não pode falar a respeito antes que tenha a vez. A indisciplina ainda é colocada como fator determinante para não organizar trabalhos em grupo, por exemplo, que seria o momento ideal para a criatividade aflorar.

O mais incrível é que quando questionados sobre as suas expectativas quanto à escola, os jovens da entrevista não querem algo de extraordinário. Pedem apenas um espaço bem cuidado e seguro, professores presentes, conteúdos que façam sentido, relações sociais estimulantes e acesso à Internet.
Que as escolas precisam se adaptar e usar tecnologia, todos já sabemos. Bem como sabemos que a culpa não é só do professor, mas de todo um sistema de ensino que não é renovado há anos, portanto, não acompanhou o ritmo da sociedade. No entanto, é preciso perder o medo de não saber, de admitir que não sabe.

Eu lembro que no início do meu trabalho como coordenadora de Programa Jornal e Educação algumas pessoas, desfavoráveis ao uso desse recurso em sala de aula, quando conheciam as minhas oficinas de formação indagavam: “Você acha que os professores não sabem ler? Você acha que precisa ensinar os professores a lerem jornal?” Eu percebia aí um receio em ter um meio de comunicação frequentando as aulas e a falta de percepção a respeito da leitura de jornal, que não é um simples texto em um papel, bem como não é uma atividade para a disciplina de Língua Portuguesa (como ainda pensam muitos “gestores” de escolas). E até hoje percebo a indiferença de muitos, que menosprezam o trabalho com mídia na educação.

Ler textos jornalísticos em sala de aula é dar ao aluno a oportunidade de descontruir a mídia, é encarar a sociedade da informação, é questionar o que estão dizendo que eu preciso saber. É claro que os professores sabem ler o texto no papel jornal, mas saberiam ler a mídia com a toda a sua estrutura pensada para conquistar os olhos do leitor? Explicar o que é uma Manchete para quem não é da área de jornalismo é extremamente difícil, querer que as pessoas entendam que notícia é uma coisa e reportagem é outra é uma missão quase impossível.

Daí alguém está lendo este texto e diz: “E daí, o que vai mudar na minha vida saber disso. É tudo jornal!”. E eu respondo: Vão mudar os seus olhos, os seus ouvidos e a sua mente quando se deparar com uma matéria de televisão que tenta enganá-lo e direcioná-lo a ter uma opinião que pode não ser a sua, como acontece neste vídeo.

Depois de assistir, vai pensar: por que não ajudar os jovens (os meus filhos) nessa leitura? Eles sabem usar a Internet, mas, muitas vezes, não sabem receber a informação e refletir sobre ela.

O que eu defendo é que quanto mais cedo o aluno encontrar na escola uma extensão da sua vida, aquela em que ele vive, na qual se alimenta, chora, ri, sente, sofre, ao invés de uma caixa fechada com frestas que geram a vontade de sair e conviver com o que há fora, mais autonomia ele terá para decidir o seu papel na sociedade.

Ele precisa conhecer a mídia, ler a mídia com “todos” os professores conversando com ele sobre isso, e com todos os professores agindo realmente em comunidade. A comunidade escolar só é construída se há pessoas atuando em conjunto naquele espaço.

Se o aluno, desde os primeiros anos escolares, consegue fazer uma leitura de jornal impresso, compreendendo a construção do fato (porque fatos são construídos, notícias são construídas a partir da visão que o repórter tem dos fatos), ciente de como a sua opinião é formada diante daquilo, relacionando a informação do jornal com o que está ao seu redor, ele percebe que a escola faz sentido porque ela está permitindo-lhe falar; percebe que a escola gera conhecimento, portanto, vale a pena estar ali.

Ficará mais fácil para o professor levar novos recursos tecnológicos para as suas aulas porque seus alunos já estarão preparados para encarar os meios de comunicação, e a escola poderá deixar de ser uma utopia.

(1) Os grupos focais foram compostos por jovens de 15 a 19 anos, de São Paulo e Recife, que ainda estudam ou abandonaram o ensino médio, com renda familiar inferior a 2.500 reais.

Fonte: Adital.
 
 
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